Apesar da estrutura altamente regrada de nosso mercado financeiro e da fiscalização da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), a bolsa não está livre de golpes, e um dos que mais causa prejuízos aos investidores é o spoofing.
Trata-se de uma manipulação de preços que ocorre nas operações de curtíssimo prazo. Ou seja, a prática afeta quem opera no day trade, podendo causar grandes prejuízos a depender do volume de negociações realizadas.
No mundo digital, o termo spoofing já é utilizado há bastante tempo para identificar golpes que envolvem falsificação de identidade. Mas no mercado financeiro ele é bem mais recente – a primeira punição ocorreu somente em 2018, no caso Paiffer Management, que veremos mais adiante.
Se você já investe em ações, ou se está estudando o mercado para dar os primeiros passos na bolsa e se tornar um trader, é muito importante conhecer as possibilidades de fraudes para saber evitá-las. Continue a leitura e entenda como funciona essa forma de manipulação de mercado.
O que é spoofing?
Spoofing é uma prática de manipulação de preços por meio de falsas ordens de compra e de venda. Basicamente, essa fraude cria uma situação de oferta e demanda atraente para o investidor, mas que é artificial. Isso faz com que as pessoas se movimentem de acordo com o interesse de quem está manipulando o mercado.
A expressão vem do termo “spoof”, que significa imitação ou enganação em inglês. Diversos golpes financeiros fazem uso dessa prática, como o envio de e-mails e mensagens de WhatsApp com links que roubam informações sigilosas do usuário quando abertos.
No mercado de capitais, a lógica é a mesma: o criminoso conquista a confiança da vítima e a induz a agir de acordo com a sua vontade. Nesse caso, o investidor acredita na falsa ordem de negociação, e isso o leva a prejuízos.
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Como funciona o spoofing?
Esse tipo de fraude tem o objetivo de aumentar o ganho de quem a pratica de uma forma que, naturalmente, não seria possível.
Por exemplo, imagine que um investidor queira vender uma ação e receber um valor bem mais alto do que a sua cotação no mercado. Para isso, ele registra uma ordem de venda e uma ordem de compra no book de ofertas de valores desproporcionais. Ao observarem o valor das propostas, os outros investidores começam a alterar as suas ofertas, e novas pessoas também inserem propostas.
Isso acaba criando um sinal falso de liquidez, ou seja, os investidores começam a acreditar que a demanda ou a oferta do ativo em questão é muito maior do que a realidade. É justamente aí que o fraudador consegue lucrar, pois os preços foram inflados de forma artificial. Por fim, quando os investidores começam a fechar negócio, a falsa oferta é cancelada, e o preço do ativo, que estava inflado, começa a voltar ao patamar original.
O mesmo raciocínio vale para quando o spoofer deseja comprar um ativo por menos do que ele vale. Nesse caso, ele envia quase simultaneamente uma ordem de compra e uma ordem de venda (ou mais) com valores abaixo do mercado, para forçar a desvalorização.
Resumo do passo a passo
Na prática do spoofing, podemos identificar quatro momentos em sequência, que são os seguintes:
1° – A manipulação do preço começa pela inserção de uma oferta falsa no book de ofertas. Isso chama a atenção dos investidores (que alteram os valores de suas ofertas) e atrai mais pessoas para a operação.
2° – Isso cria uma sensação de liquidez que não existe de fato.
3° – Em reação à falsa liquidez, os investidores começam a fechar as ordens de compra e venda.
4° – Ao alcançar o seu objetivo de manipular o preço, o fraudador cancela a oferta.
Spoofing é considerado crime?
Sim. A prática de spoofing é considerada crime contra o mercado de capitais, de acordo com a Lei 6.385/76. O artigo 27-C trata especificamente da manipulação do mercado, e prevê pena de um a oito anos e multa de até três vezes a vantagem obtida em decorrência do crime.
Em março de 2018, a CVM julgou o primeiro processo no Brasil que envolveu esse tipo de manipulação de mercado. A empresa Paiffer Management e seu sócio, José Joaquim Paiffer, foram condenados a pagar uma multa de R$ 2,4 milhões.
Segundo informações da época, o valor representou o dobro dos ganhos auferidos com negociações de contratos futuros de dólares e Ibovespa, além de opções da Vale e Petrobras. Na verdade, a empresa fraudava os pregões já há alguns anos. Em novembro de 2013, ela registrou uma oferta de compra de R$ 50 mil opções da vale e, logo em seguida, registrou oferta de venda de R$ 2 milhões da mesma opção. Com a pressão vendedora, o preço do papel caiu abruptamente.
A investigação do caso apontou que a Paiffer havia executado milhares de vezes esse tipo de operação, e que mais de 95% de suas ofertas eram canceladas depois de poucos segundos. Na ocasião, José Paiffer disse que a CVM havia sido “arbitrária” em sua decisão e que iria recorrer, mas o dano a sua imagem e de sua empresa permanece até hoje.
Spoofing e layering: qual a diferença?
Assim como o spoofing, o layering também é um crime de manipulação de mercado, e obedece à mesma sistemática. A diferença é que, no caso do spoofing, normalmente há só um grande investidor envolvido, que opera com uma ordem e outra contrária de valores elevados. Já o layering conta com a participação de pequenos grupos, que se unem para inserir diversas ordens de valores mais baixos, também sem a intenção de executá-las.
Ou seja, no spoofing, a força manipuladora costuma ser uma só, que realiza operações de valores expressivos. Por outro lado, no layering, a manipulação ocorre em lotes menores, o que acaba gerando o mesmo efeito de falsa liquidez.
Como se proteger do spoofing?
Existem algumas ferramentas no trade que permitem identificar as ofertas de compra e venda que são inseridas no book e canceladas pouco tempo depois. Dessa forma, é possível observar o padrão do spoofing ao longo do tempo, mas essas ferramentas normalmente não são acessíveis aos pequenos investidores.
Como a quantidade de ofertas cadastradas no book é gigantesca, é praticamente impossível que o trader consiga acompanhar todas elas. Por isso, a melhor forma de se proteger do spoofing é confiar somente nas ordens executadas, ou seja, nos negócios efetivamente realizados. Essa é a forma mais segura de se identificar possíveis zonas de suporte e resistência e a tendência dos ativos de forma geral.
Além disso, é fundamental acompanhar o mercado para poder perceber quando uma oferta parece boa demais ou está muito descolada do mercado.