Muitas pessoas veem na bolsa de valores uma grande oportunidade de construir um patrimônio para suas famílias ou para si mesmo. E apesar do grande foco ainda estar no ganho de capital proporcionado pelas flutuações do mercado, existem muitos investidores que adotam uma estratégia diferente. Essa se refere ao investimento em empresas que costumam pagar bons dividendos, e ao passo que esses vão sendo pagos, podem ser reinvestidos a fim de aumentar suas posições, possibilitando uma excelente rentabilidade passiva depois de um período investido.
Mas nem todas as empresas do mercado possuem características favoráveis para essa estratégia, seja por filosofia do time de gestão, fase em que se encontra o negócio, setor econômico e outros. Assim, existem algumas métricas que podem auxiliar o investidor a encontrar empresas que pagam bons dividendos, historicamente, ou oportunidades conforme a situação atual dessa.
Dividend Yield
Quando se fala em alguma métrica para a avaliação de uma empresa pagadora de dividendos a primeira que vem à mente é o dividend yield. E essa popularidade do indicador é originária de seu grande poder informacional, pois é capaz de resumir em apenas uma taxa o comportamento histórico do ativo com relação à sua política de distribuição de dividendos, e da facilidade de se conseguir os dados necessários para o cálculo, além do cálculo, o qual é muito simples.
O dividend yield é uma estimativa de retorno que aquela ação pode dar ao investir considerando apenas os dividendos pagos. Com essa informação é possível verificar se a companhia possui um histórico de pagamentos de dividendos e possibilita os investidores a projetarem a quantia que podem receber no futuro. Para o cálculo dessa métrica, será necessário a soma de dividendos em um período considerado, como 12 meses, e dividir esse número pelo atual preço da ação. Por exemplo, uma empresa que tenham pagado R$ 2 de dividendos em janeiro e R$ 3 em novembro, totalizando R$ 5 no fim do ano. Caso a cotação da empresa estivesse em R$ 25, o dividend yield seria de 20% (R$5/R$25). Indicando que se a empresa mantivesse esse padrão de pagamentos e a cotação, em 5 anos o investidor teria um valor equivalente ao pago pelo papel.
É importante de se lembrar que o papel do preço da ação como denominador pode causar distorções após grandes valorações e desvalorizações, transmitindo uma impressão errada sobre uma possível oportunidade.
Payout
Considerando as distorções que o preço da ação pode causar, devemos analisar outros indicadores que não tenham o preço como componente. Assim, o dividend payout ratio, ou só payout, surge como complemento à métrica anteriormente citada. Seu cálculo é tão simples quanto o do dividend yield, mas as informações podem ser mais difíceis de se encontrar.
Seu foco é indicar quanto os dividendos distribuídos representam do lucro líquido registrado no período, em termos percentuais. Por exemplo, uma empresa que tenha terminado seu trimestre com lucro líquido de R$ 4 bilhões e decida distribuir R$ 1 bilhão para seus acionistas terá um payout de 25% (1/4) naquele período.
Assim, o investidor pode ter um parâmetro mais fixo sobre como foram as decisões da empresa em exercícios lucrativos com relação aos dividendos e permite que esse projete de acordo com a expectativa de lucros futuros. Esse percentual nunca será menor que 0%, mas pode ser maior que 100%, pois algumas empresas distribuem dividendos maiores que o lucro registrado.
Dívida Líquida sobre EBITDA
Iniciando com as métricas mais profundas vista em análises de empresas pagadoras de dividendos temos a Dívida Líquida sobre o EBITDA, do inglês Net Debt to EBITDA ratio. É considerado um indicador mais aprofundado, pois não tem uma relação direta com os dividendos e pode ser um pouco complicado de se calcular.
Para seu cálculo serão necessárias algumas contas que podemos encontrar no balanço patrimonial e demonstração de resultado da empresa. Primeiro o caixa e equivalentes de caixa e financiamentos e empréstimos de curto e longo prazo, para subtrair o primeiro do segundo. Desta forma temos uma ideia de quanto recurso a companhia está em débito, mas não tem dinheiro em caixa para cobri-lo. Depois, dividimos tudo pelo EBITDA para ter uma ideia de quantos anos, com operação e dívida estáveis, a companhia precisa para zerar sua dívida. O EBITDA nessa equação funciona como uma estimativa de geração de caixa.
Quanto menor esse índice, melhor será a expectativa de dividendos no longo prazo, uma vez que a empresa não terá seus ganhos restringido pelas dívidas a serem pagas no futuro. Mas existe uma margem, que apesar de positiva, ainda é saudável, como abaixo de 2,5, pois dívidas são necessárias para proporcionar o crescimento das empresas, só não podem sair do controle.
Fluxo de caixa livre para o acionista
Uma métrica pouco utilizada por conter algumas variações de metodologia quanto ao seu cálculo, o que não retira seu valor informacional. Para se calcular o Fluxo de Caixa Livre para o Acionista, ou FCFE do inglês Free Cash Flow to Equity, serão consideradas três contas da demonstração de fluxo de caixa, sendo essas: o total de caixa gerado pelas atividades operacionais, capital dispendido (CAPEX) em investimentos e dívida líquida emitida.
Com o caixa gerado pelas atividades operacionais em mãos, é só subtrair o dispêndio de capital (CAPEX) e somar a dívida líquida emitida. Por exemplo, uma empresa gerou R$ 10 bilhões de caixa com a operação, mas gastou R$ 4 bilhões em investimentos, até aqui resultando em R$ 6 bilhões em caixa. Mas para compensar esse capital em investimentos, a empresa aumentou sua dívida em R$ 3 bilhões. No fim do dia, o Fluxo de Caixa Livre para o Acionista foi de R$ 9 bilhões (10-4+3=9).
É improvável que esse valor seja totalmente distribuído, mas possibilita que o investidor tenha uma ideia de quanto dinheiro disponível a companhia teria para uma eventual distribuição de dividendos. Permite também entender a origem do dinheiro que será distribuído, se veio de um bom resultado operacional da empresa ou de reservas acumuladas de outros exercícios.
Caixa e Reservas de Lucro
Algo que não é muito visto por investidores individuais, mas analisado por muitos investidores ativistas, é o caixa e as reservas de lucro da companhia. Existem algumas empresas que baseiam sua tese de crescimento em aquisições, e para isso deixam uma enormidade de dinheiro em caixa para garantir o poder aquisitivo em uma eventual oportunidade. Nos últimos 15 anos, a Microsoft se tornou o perfeito exemplo desse modelo de gestão. Entre as aquisições estão Skype, por US$ 8 bilhões, LinkedIn, por US$ 26,2 bilhões e, sua maior compra na história, a Activision Blizzard por US$ 68,7 bilhões com dinheiro que estava em caixa da companhia.
Mas em outros casos, com da também americana Apple, que tinha uma cultura de não distribuir dividendos, acaba se tornando difícil justificar um caixa gigantesco parado. Isso atrai os famosos investidores ativistas, que compram uma fatia relevante da empresa, entram para o conselho, e forçam a distribuição desse caixa em forma de dividendos. Algo similar, em parte, com o que aconteceu na Petrobras esse ano, onde o governo federal usou de sua influência no conselho para aprovar dividendos em volume recorde, sendo parte desses recursos de reservas de lucro.
Portanto, se uma empresa está com seu caixa ou reserva de lucros em níveis historicamente altos, mas não o perfil para mantê-lo ou forma de justificá-lo, pode ser um indício que parte desse valor pode ser distribuído em forma de dividendos.
Características da Empresa e Setor
Além de todos esses citados, ainda há alguns fatores importantes para considerar. O primeiro é o setor em que a companhia está inserida. As empresas que mais pagam dividendos historicamente estão em setores de estabilidade, como o de energia elétrica, pois a receita dessas empresas não tendem a mudar muito e os investimentos são bem diluídos ao longo do exercício, tornando possível um fluxo de caixa positivo recorrentemente. Assim como empresas de intermediação financeira, materiais básicos, óleo e gás, serviços médicos e seguradoras e resseguradoras. Por outro lado, as empresas de tecnologia não têm a cultura de pagar dividendos, isso se deve ao fato de que muitas delas dedicam todo capital disponível para impulsionar seu crescimento, assim, não sobra muito (ou nada) para remunerar os acionistas.
Algumas empresas possuem uma política definida sobre o pagamento de dividendos, trazendo uma certa previsibilidade para os investidores. Como a Vale, que determina em estatuto o pagamento mínimo de dividendos em 30% do EBITDA ajustado menos o investimento corrente, devendo ser divididos em duas parcelas, uma em março e outra em setembro. Isso não garante que outras empresas não distribuíam volumes maiores em dividendos, porém, poucas terão uma política que permita estimar os dividendos com tamanha precisão.
Os tipos de ações também se mostram de extrema relevância nesse contexto. As ações preferenciais deixam o acionista em posição prioritária em eventos de distribuição de dividendos, juros por capital próprio e liquidação da companhia. Portanto, se o direito ao voto concedido pelas ações ordinárias não é importante para o investidor, a melhor escolha seria comprar ações preferenciais.