Depois de dois anos minguados, parece que a recuperação do mercado de capitais brasileiro finalmente está chegando. Nas últimas semanas, as perspectivas de queda da inflação e aumento do Produto Interno Bruto (PIB) contribuíram para a manutenção do Ibovespa em alta.
Para o banco americano JPMorgan, o principal índice da bolsa brasileira tem espaço para subir 13% até o final de 2023. Recentemente, um de seus executivos declarou a Bloomberg que as ações brasileiras “são a aposta mais simples do mercado, por causa do valuation baixo combinado com juros menores”. A instituição foi ainda mais incisiva, e chegou a afirmar que, por esses fatores “o mercado acionário brasileiro deve ofuscar os pares latino-americanos”.
Os fatos positivos que marcaram o mercado brasileiro nas últimas semanas contribuíram para uma mudança de percepção quanto aos ativos de risco. Para refletir essa nova perspectiva, os analistas da Terra Investimentos revisaram a projeção para o Ibovespa, que deve terminar o ano na faixa de 125 e 135 mil pontos. A projeção anterior era de que o índice fechasse 2023 entre 120 e 125 mil pontos.
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Afinal, por que o Ibovespa está em alta?
A seguir, confira a análise que Luis Novaes, do time de Research da Terra Investimentos, fez sobre cada um dos aspectos que influenciam positivamente nossa bolsa hoje.
Percepção de maior estabilidade institucional
Inicialmente, a perspectiva de aumento dos gastos públicos por parte do novo Governo Federal gerou apreensão no mercado. Nesse sentido, o receio era de que a estabilidade fiscal fosse comprometida, devido a críticas à regra fiscal vigente e à promessa de menor rigor no futuro. No entanto, a eleição de um Congresso com ideias opostas reverteu essa percepção.
“A divisão de poderes criou a perspectiva de que propostas nocivas à estabilidade fiscal teriam menos chances de serem aprovadas, o que equilibrou os poderes de forma mais eficiente. Além disso, a votação do novo arcabouço fiscal e de projetos paralelos do governo fortaleceu essa perspectiva de maior estabilidade institucional”. observa Novaes.
Dados econômicos positivos
Durante a pandemia, foram implementados estímulos econômicos que resultaram em um significativo choque inflacionário no último ano. Diante dessa necessidade de resposta, o Banco Central iniciou o aperto monetário, visando conter o avanço da inflação.
Após meses de aumento da Selic, a expectativa era de que a economia fosse significativamente impactada. Porém, os dados de crescimento se mostraram positivos, mesmo que com alguns segmentos econômicos em desaceleração.
“Os dados de inflação mostraram que o aperto monetário estava cumprindo seu objetivo de forma eficiente, o que levou o mercado a revisar suas expectativas de crescimento. Essa revisão favorável impulsionou o investimento em ativos de risco, incluindo ações”, explica.
Queda nos juros futuros
As preocupações quanto à estabilidade fiscal caíram, ao mesmo tempo que os índices de inflação demonstraram um comportamento melhor do que o esperado. Com isso, o mercado passou a precificar o início de um ciclo de corte de juros mais cedo do que o previsto.
“Essa redução nas taxas de juros futuros serviu como estímulo para que os investidores aumentassem suas posições no mercado acionário, impulsionando assim os preços dos ativos negociados”, diz Novaes.
Ativos muito descontados
A instabilidade econômica dos últimos anos teve um impacto negativo nos resultados de várias empresas, especialmente as de setores cíclicos. Além disso, os altos rendimentos dos títulos soberanos (no Brasil e exterior) fizeram com que os ativos de risco ficassem menos atraentes.
Segundo Novaes, a preocupação dos investidores em relação à estabilidade fiscal e aos efeitos do aperto monetário sobre o crescimento econômico também afetou negativamente a atratividade das empresas brasileiras. Por isso, suas ações começaram a operar bem mais descontadas em relação aos seus padrões históricos. Com a melhoria da perspectiva e a redução das preocupações, esses papéis se tornaram grandes oportunidades de investimento, atraindo assim mais investidores para o mercado de ações.
E por quanto tempo podemos contar com o Ibovespa em alta?
Apesar do atual otimismo com a bolsa, Novaes ainda não vê com clareza para onde vai o mercado acionário nos próximos meses. Isso porque existem alguns riscos associados ao atual patamar do Ibovespa, os quais ele explica a seguir.
Nem todos os ativos já estão se recuperando
Embora tenha havido evolução nos preços das ações nas últimas semanas, alguns setores ainda estão descontados em relação aos seus padrões históricos. É o caso de empresas de pequena capitalização do setor de consumo, por exemplo, que ainda estão para trás, o que pode indicar um potencial de valorização adicional.
Ciclo de juros em baixa
A curva de juros futuros tem mostrado queda nas últimas semanas, refletindo uma redução das expectativas em relação aos juros nos próximos anos. Embora o ciclo de redução dos juros básicos ainda não tenha começado e esteja projetado para iniciar em agosto, essa perspectiva de queda pode impulsionar ainda mais a valorização dos ativos.
Resultados futuros
Novaes ressalta que, até o momento, a alta da bolsa está baseada principalmente em expectativas, pois as empresas ainda não apresentaram resultados melhores. Logo, se os resultados da próxima temporada de balanços forem melhores, ainda haverá espaço para uma valorização adicional dos ativos.
Máxima dos últimos anos
Atualmente, o Ibovespa está próximo dos patamares máximos dos últimos anos. Para Novaes, essa proximidade pode desencadear um recuo dos ativos, já que os investidores podem preferir aguardar por dados mais concretos antes de se comprometerem com um movimento de alta mais prolongado.
Fluxo de fundos e estrangeiros
Os investidores institucionais e estrangeiros influenciam significativamente a evolução dos preços no mercado. Nesse sentido, Novaes observa que, embora tenha havido avanço nas últimas semanas e uma nova perspectiva, o fluxo de recursos para os fundos de investimento pode não ser tão significativo a ponto de favorecer um novo movimento de alta.
“Além disso, o volume diário de negociações não apresentou grandes alterações durante a valorização recente, o que pode indicar um movimento enfraquecido. Embora tenha havido um aumento do fluxo de investimento estrangeiro, é importante observar que esse fluxo pode ser resultado de uma realocação de recursos em resposta a um ambiente de instabilidade, e não necessariamente um novo investimento líquido”, alerta.
Drivers para os principais ativos
Entre os destaques desse movimento de alta, temos a Petrobras, cujo horizonte futuro é incerto. Isso porque a política de dividendos, principal atrativo da empresa nos últimos anos, pode ser mantida no curto prazo, mas não há indicativos de que isso permanecerá sem grandes alterações no longo prazo. Novaes avalia que há outras incertezas que podem interromper a valorização da Petrobras e, consequentemente, do mercado, dada a relevância da empresa para o índice.
Outros ativos de peso no mercado, como os bancos e a mineradora Vale, também enfrentam um período incerto. O aumento dos juros pode pressionar os índices de inadimplência e afetar os resultados do setor financeiro no futuro. Já no caso da Vale, o desempenho fraco da economia chinesa também representa um desafio significativo.